10
abril

Até quando?

Meu post de hoje é triste. Quero mostrar a reportagem de Leticia Duarte  para a Zero Hora  de hoje que relata com delicadeza e precisão, o sofrimento do Vladimir, meu marido, tentando conseguir atendimento para o filho, o Luiz Marcelo, em uma luta que infelizmente ele perdeu. Ao mesmo tempo me orgulho de ver que em meio à dor da perda do filho ele tenha vontade de lutar para que o mesmo não aconteça com outras pessoas!

Caos na Saúde 09/04/2013 | 21h28

Pai perde filho antes de conseguir atendimento em emergência na Capital

Durante três dias, família buscou leito para paciente com câncer
Vladimir no blog detalhes magicos
Vladimir Duarte Dias percebe “estado de guerra” na rede Foto: Jefferson Botega / Agência RBS

Letícia Duarte

leticia.duarte@zerohora.com.br

Com cinco recibos de ambulância sobre a mesa, empilhados sobre os exames que na quinta-feira passada diagnosticaram um mieloma múltiplo avançado em seu filho de 52 anos, o consultor em investimento e comércio exterior Vladimir Duarte Dias, 80 anos, remói o sentimento de impotência de quem enfrentou o calvário em busca de um leito de emergência na rede de saúde. E perdeu.

Entre quinta e domingo, a família apelou para uma dúzia de médicos conhecidos, telefonou para quatro hospitais credenciados ao IPE, passou cinco horas com o filho em frente ao Hospital de Clínicas. Mas a morte chegou antes do atendimento de que buscavam.

A peregrinação, que revela mais um capítulo da crônica superlotação da rede, começou no dia 11 de março. Como Luiz Marcelo Dias andava apático e quase não comia, o pai decidiu buscar ajuda. Embora tomasse medicação contínua para esquizofrenia, o morador do bairro Petrópolis mantinha um quadro estável nos últimos oito anos, o que fez o pai desconfiar de que algo mais estava acontecendo. A primeira tentativa de atendimento foi na Santa Casa. Ao chegar na emergência do hospital Dom Vicente Scherer, o consultor desanimou ao ver uma placa avisando que o tempo mínimo de espera era de sete horas.

Para ganhar tempo, optou por interná-lo no Hospital Espírita, em uma ala psiquiátrica. Paralelamente, agendou a realização de exames pelo IPE, o plano de saúde da família, no Hospital da PUC. Diante da descoberta de que o filho estava com metástase nos ossos, na coluna e no quadril, com diagnósticos obtidos entre quinta e sexta-feira, se intensificou a busca por atendimento especializado. Como Marcelo estava fraco, gemia de dor e já não comia, a orientação dos médicos do Hospital Espírita era de que precisava ser transferido para uma emergência. Só que não havia leito disponível.

Durante três dias, a família recorreu a todos os caminhos conhecidos para tentar a transferência. Em vão. Nas ligações para Santa Casa, Hospital da PUC, Hospital Conceição e Hospital Ernesto Dorneles, ouviram a mesma resposta: todos estavam lotados. Superlotados. No domingo, com o agravamento do caso, o médico plantonista no Hospital Espírita ligou ele mesmo para o Clínicas, que teria concordado em receber o paciente. O pai contratou uma ambulância particular para transportá-lo, testemunhando os gemidos de dor do filho a cada paralelepípedo que a ambulância percorria até o destino. Mas a esperança durou pouco. Ao chegar, deparou com portas fechadas.

— Nem olharam o meu filho. Disseram que aqueles não eram os papéis adequados, que não tínhamos passado pela regulação do Samu, e não deixaram nem passar da porta — lamenta.

Depois de cinco horas de espera, sem que os contatos telefônicos conseguissem resolver a situação, o paciente acabou devolvido para o Hospital Espírita. Oito horas mais tarde, o pai recebeu o telefonema com a notícia que tanto temia.

— Ele só voltou para morrer — chora o pai, que enterrou o filho às 17h de segunda-feira, no Cemitério São Miguel e Almas.

Leia mais:
Medidas apresentadas há um ano ainda não venceram superlotação de emergências na Capital

Pai percebe “estado de guerra”

Formado em ciências políticas e atuariais, com pós-graduação em Desenvolvimento Econômico e Social pela Comissão Econômica para a América Latina da ONU, o consultor Vladimir Duarte Dias têm ciência de que a morte do filho era um destino previsível diante da gravidade do câncer descoberto repentinamente.

Mas não se conforma em tê-lo perdido antes mesmo de conseguir um leito que poderia amenizar seu sofrimento.

— Nessas horas não adiante ter conhecimento, recurso. O problema é estrutural.

Do alto de sua dor, acredita que a situação da saúde pública precisa ser encarada como um cenário de guerra pelas autoridades. Gostaria de ver as forças armadas agindo com hospitais de campana para ajudar a minimizar o caos reinante, como se faz nos campos de batalha.

— Estamos em um estado de guerra, não pode ser tratado de forma convencional — defende.

Autor de livros como Genealogia da Liberdade, também reflete sobre a ganância que teria feito muitos médicos acastelarem-se em “nos casulos de suas fortalezas de alto padrão e clientes de grande poder econômico e político”. Mas considera que a principal responsabilidade é do poder público, que não tem plano de ação e age tentando tapar furos.

— Não adianta brigar com ninguém no balcão, a responsabilidade pelo que aconteceu está nos palácios, e eles não vão ouvir.

Apesar de tudo, diz que não sente raiva.

— A raiva não ultrapassa um metro. O amor é capaz de dar a volta ao mundo.

Paixão por automobilismo

Apaixonado por automobilismo, Luiz Marcelo Dias chegou a ser piloto de fórmula especial na juventude. Com o diagnóstico de esquizofrenia, pouco depois dos 20 anos, passou a ter uma vida mais reclusa, mas com o aprimoramento dos tratamentos para a doença vinha-se mantendo bem na última década. Atualmente, morava com a mãe no bairro Petrópolis e jogava tênis regularmente. Um de seus hobbies era montar e desmontar os motores de dois calhambeques que mantinha em frente de casa. É lembrado por familiares como uma pessoa doce, humilde e amorosa.

ZERO HORA

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